Educar para Conservar: compreendendo a importância da Biodiversidade
Na busca pela conservação da biodiversidade, um ponto que se destaca como ferramenta indispensável é a educação ambiental, e dentre as diversas atuações do Programa Amigos da Onça, uma ação primordial é o trabalho de educação para conservação. Como no dia 26 de janeiro comemorou-se o Dia Mundial da Educação Ambiental, vamos falar um pouco sobre esse tema tão importante?
Essa data foi instituída em 1975 pela UNESCO, durante o primeiro Encontro Internacional de Educação Ambiental que aconteceu em Belgrado, hoje capital da Sérvia. Neste encontro, foi elaborada a Carta de Belgrado, que constitui um marco na história das questões ambientais. Este documento propõe dentre outros pontos, uma nova abordagem de desenvolvimento que englobe o equilíbrio entre humanidade e a natureza, e a erradicação de causas básicas de degradação do meio ambiente, enfatizando a importância da educação ambiental como um elemento indispensável para enfrentar a crise ambiental global.
A partir de então, a trajetória da educação ambiental passou por diversas transformações ao longo dos anos. Inicialmente voltada para a sensibilização das pessoas a respeito dos impactos do crescimento da industrialização e urbanização ao meio ambiente, com foco mais centrado na informação. E, atualmente com uma perspectiva mais crítica, não apenas voltada para informar, mas a levar as pessoas a refletirem e participarem nas questões ambientais. Essa nova concepção hoje é conhecida como Educação Ambiental Crítica, na qual busca-se através da reflexão crítica estimular mais participação e engajamento ativo da população (Guimarães, 2004).
Equipe do PAO em um trabalho de educação para conservação das onças em uma comunidade do Boqueirão da Onça. Foto: Arquivo Programa Amigos da Onça.
Nesse contexto, percebemos que incluir a educação voltada para a temática ambiental é essencial para ampliar a visão das pessoas sobre a relevância da biodiversidade e os efeitos das atividades humanas sobre ela. Através desse trabalho educativo é possível trazer uma compreensão mais profunda a respeito das interações entre os seres vivos e da importância de cada espécie no equilíbrio dinâmico dos ecossistemas, de maneira a criar possibilidades de estimular comportamentos mais responsáveis em relação ao meio ambiente.
Curso sobre manejo de rebanhos paras as comunidade do Boqueirão da Onça. Foto: Uarli Pascal.
E, afinal, qual a importância da biodiversidade? Por que investir em trabalhos de educação para conservação?
A biodiversidade sob a ótica de Brandão et al (2021), é uma organização biológica complexa que envolve genes, espécies, populações, comunidades, ecossistemas e biomas, de forma que a composição, função e estrutura de todos os elementos estão interligados. E essa diversidade biológica tem um papel fundamental na manutenção da vida ao fornecer uma variedade de serviços como regulação do clima, purificação da água, polinização, dentre muitos outros, além de disponibilizar bens e recursos naturais (desde alimentos à medicamentos) imprescindíveis para a sobrevivência e bem-estar humano.
E apesar deste fato ser de conhecimento geral, a realização de trabalhos de educação para conservação se justifica pela necessidade de ressaltar que o funcionamento dos ecossistemas depende da sua constante manutenção e das interações entre milhares de organismos que os integram (Bayma et al, 2022). E que, embora nem todas as espécies apresentem a mesma importância para o desenvolvimento dos ecossistemas, todas as espécies são vitais para seu funcionamento, inclusive, muitas espécies raras são responsáveis por funções essenciais nos processos ecológicos e sua extinção pode levar a desintegração de um ecossistema (Mouillot et al., 2013). Um bom exemplo são os lagartos, em sua grande diversidade de espécies, muito presentes na Caatinga, que à primeira vista podem parecer irrelevantes mas são fundamentais para os ecossistemas, pois se alimentam de insetos, e assim auxiliam a regular a população desses artrópodes, inclusive aqueles considerados pragas agrícolas e vetores de doenças. E infelizmente, muitas dessas espécies estão ameaçadas de extinção (Ciência Hoje, 2023).
Lagarto papa-vento (Enyalius bribonii) Foto: Marco Freitas (Ciência Hoje).
Esquema apresentando a estrutura hierárquica de organização da biodiversidade, considerando sua complexidade de composição, estrutura e função, demonstrando como todos os processos estão interligados. Fonte: Brandão et al., 2021. Adaptado de NOSS, 1990
Considerando que toda espécie tem sua importância para o bom desenvolvimento dos processos ecológicos, um dos propósitos do Programa Amigos da Onça inclui identificar e entender os comportamentos humanos para, se possível, influenciá-los em favor da conservação das espécies em seus habitats, especialmente as onças-pintadas (Panthera onca) e onças-pardas (Puma concolor), bem como suas presas naturais. Desta forma, o PAO realiza cursos e palestras na sua área de atuação: temas relacionados aos impactos das atividades humanas sobre a fauna da Caatinga; alternativas de uso sustentável dos recursos da Caatinga, principalmente sobre o uso da água, dentre outras. Além de orientações voltadas para as próprias comunidades da região, como medidas mitigadoras para redução de conflitos socioambientais entre humanos e fauna silvestre.
O trabalho de educação para conservação envolve muitas ações como palestras e diálogos com a comunidade. Fotos: Arquivo Programa Amigos da Onça.
Curso de horta de baixo custo realizado nas comunidades. Fotos: Arquivo Programa Amigos da Onça.
No cenário atual de avanço da tecnologia e mídias digitais, é possível ultrapassar as fronteiras geográficas, ampliando o alcance do trabalho educativo a um público muito maior. O PAO que desde o início de sua configuração se preocupa em realizar uma abordagem de educação ambiental participativa, tem aproveitado o crescimento das redes sociais, atuando fortemente para promover a educação para conservação, e, satisfatoriamente, as mídias sociais têm se mostrado eficientes neste objetivo. Recentemente fizemos uma pesquisa de público, e ficamos felizes com os resultados nos quais nossos seguidores afirmaram ter ampliado o conhecimento com nossos conteúdos sobre a Caatinga e sua fauna, assim como foram estimulados a terem comportamentos mais responsáveis com relação ao meio ambiente!
Outro aspecto significativo no trabalho de educar para conservar, é envolver também as crianças nesse processo. Uma ação muito divertida que o PAO elaborou pensando nisso, foi a cartilha “Na trilha da onça”. O material foi feito em duas versões, uma para as crianças de 0 a 5 anos com atividades educativas abordando a fauna e flora da região, e outra para 6 até 12 anos incluindo também o tema de convivência entre pessoas e onças. Essas cartilhas foram elaboradas para serem distribuídas primeiramente nas escolas da região do Boqueirão da Onça, e visam contribuir no processo de aprendizagem sobre a importância da conservação da vida selvagem de uma forma lúdica. Com essas cartilhas, o PAO pretende trazer informações importantes de forma leve tanto para crianças na Caatinga, quanto onde a distribuição geográfica as façam chegar.
Entrega das Cartilhas “Na Trilha da Onça” em Morro do Chapéu. Foto: Prefeitura de Morro do Chapéu.
Em maio de 2023 o material foi impresso com o apoio do nosso parceiro STP Sustainable Trade Partner. As cartilhas foram entregues em dois eventos no município de Morro do Chapéu, Bahia, que contaram com a participação de escolas locais. O Projeto Bichos de Morro, da UFRB, nos ajudou nas entregas, foi um sucesso, as crianças fizeram a leitura da cartilha e se divertiram com os passatempos. Se você ficou curioso para conhecer as cartilhas, pode baixar aqui! Envolver o público na participação da construção do conhecimento pró-conservação da biodiversidade é fundamental desde a infância. As crianças e jovens são agentes potenciais de mudança, capazes de influenciar positivamente suas famílias e comunidades, criando um impacto multiplicador na promoção de práticas sustentáveis e na conservação do meio ambiente.
Teatro para crianças na comunidade de Queixo Dantas. Foto: Uarli Pascal.
Apesar de o trabalho de educação para conservação ser imprescindível, também enfrenta muitos desafios em sua execução. A falta de recursos muitas vezes é um ponto limitante no desenvolvimento de programas educativos, bem como alguns fatores histórico-culturais de comunidades tradicionais, que acabam dificultando a aceitação e participação das pessoas. O trabalho de educação ambiental deve ser um esforço conjunto, envolvendo tanto a sociedade, quanto ONGs, instituições de ensino e pesquisa públicas e privadas, escolas, empresas privadas e governo, de forma a criar uma cultura de responsabilidade ambiental para as próximas gerações. Compreender desde cedo a importância e o papel de cada espécie em nossa rica biodiversidade se faz necessário para garantir a sobrevivência e coexistência de todos.
Escrito por: Alice M. G. Dórea (Estagiária voluntária do PAO)
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