Mulheres na Linha de Frente da Caatinga: Conheça as Pesquisadoras do Programa Amigos da Onça
No dia 10 de julho, o Programa Amigos da Onça comemorou seu aniversário de 12 anos! De 2012 para cá, o cenário ambiental do país tem se transformado, com mudanças nas políticas governamentais, desafios ambientais, criação de áreas protegidas, novos impactos de uso do solo e avanços em pesquisas sobre as onças. Desde a aprovação da região do Boqueirão da Onça, BA, como Unidade de Conservação (UC) em 2018, a atuação do Programa se diversificou em cada uma das nossas frentes (Ecologia/Biologia e dimensões humanas). Até aqui, já são 18 chiqueiros construídos, 4 onças monitoradas (saiba mais sobre elas aqui), 27 mamíferos terrestres identificados e 35 localidades alcançadas, além da elaboração e distribuição das nossas cartilhas educativas com auxílio de parcerias.
Entrega das cartilhas “Na Trilha da Onça”, em março de 2023, realizada pelo PAO em parceria com o Bichos de Morro e STP na região do Morro do Chapéu (BA). Confira mais fotos e informações sobre a entrega no nosso post do Instagram!
Até aqui, você já conheceu e acompanhou a história do Programa, mas você conhece quem está por trás dos projetos planejados e desenvolvidos até aqui? Pensando nisso, trouxemos uma entrevista com as pesquisadoras e estagiárias que fazem o PAO acontecer e lutam diariamente pela defesa da nossa biodiversidade!
Ao longo desses anos, muitas ações de educação ambiental foram feitas com a população do bioma, incluindo teatro, minicine e a distribuição das cartilhas do PAO para as crianças, com atividades voltadas ao reconhecimento de características do ambiente em que habitam. Qual ação de educação ambiental foi mais marcante para você e por quê?
Carolina Esteves, bióloga pesquisadora associada do Instituto Pró-Carnívoros e co-fundadora do “PAO”: “A ação de educação ambiental que mais me marcou foi quando fomos pela primeira vez à região da nossa área de estudo, o Boqueirão da Onça, no norte da Bahia, e ainda sem experiência com as comunidades da região levamos um ‘minicine‘ e exibimos um filme para na comunidade de Queixo Dantas. Nós projetamos o filme na parede da sede da Associação de Moradores e foi uma experiência muito bacana, pois muitas crianças e adultos nunca haviam ido ao cinema. Ver esse primeiro contato deles com uma exibição em ‘tela’ maior foi emocionante. Outra ação que me marcou muito ocorreu no começo desse ano, onde distribuímos as nossas cartilhas para essa mesma comunidade e ensinamos sobre a conservação das onças e a ecologia desses animais e da região, além do mascote de onça-pintada que levamos e as crianças ficaram maravilhadas.”.
Exibição do filme no nosso “minicine” como primeira atividade educativa do PAO, em 2012, na comunidade de Queixo Dantas. Imagem: Acervo do PAO
O Programa está completando 12 anos e o cenário da Caatinga mudou muito nesse tempo que passou, como a regulamentação da região do Boqueirão da Onça como Unidade de Conservação, que só ocorreu em 2018 (6 anos após a criação do programa). Assim, quais avanços feitos pelo Programa você acha que foram cruciais para a conservação da região do Boqueirão até então?
Renata Barros, bióloga pesquisadora do Programa e ex-voluntária de comunicação: “Dentre os principais avanços e contribuições realizados pelo Programa, considero alguns mais importantes. Um exemplo significativo foi o monitoramento da primeira onça-parda na Caatinga, chamada Vitória. As informações obtidas durante o seu monitoramento continuam sendo utilizadas para entender os padrões de comportamento e habitat desses predadores, sendo cruciais para sustentar os esforços de conservação das onças-pardas e pintadas na região. Outro avanço notável foi a identificação de 27 espécies de mamíferos de médio e grande porte silvestres na região pelo Programa. Antes dessa iniciativa, não havia uma lista oficial dessas espécies na área. Esse conhecimento foi fundamental para a regulamentação do Boqueirão da Onça como Unidade de Conservação, fortalecendo os esforços de conservação e manejo sustentável na região.”
Registro da primeira onça-parda monitorada na Caatinga, batizada de Vitória. O seu primeiro contato com a nossa colaboradora externa e chefe do Núcleo de Gestão Integrada (NGI) do ICMBio, Claudia Bueno, junto à sua equipe de resgate ocorreu em 2017. Vitória foi assassinada aos tiros, mas você pode saber mais sobre sua história conferindo a reportagem cedida por Cláudia ao Jornal (((o))) eco, em 2018. Imagem: Acervo do PAO
Considerando a importância das onças-pintadas e onças-pardas como predadores de topo e seu papel crucial na manutenção do equilíbrio ecológico da Caatinga, como a presença dessas espécies impacta o ecossistema local? Quais são as principais ações do Programa Amigos da Onça para monitorar e proteger essas espécies, especialmente em face dos desafios específicos como a caça ilegal e a perda de habitat?
Daiana Polli, pesquisadora associada ao PAO que estuda a ecologia de mamíferos e conservação de onças-pintadas e pardas: “A presença das duas espécies de onças indica ‘qualidade ambiental‘, pois são espécies muito sensíveis e especialistas, principalmente as onças-pintadas, que dependem de extensas áreas, disponibilidade de água, refúgios, presas e de parceiros reprodutivos. Assim, dizemos que onde tem onça, tem um ecossistema equilibrado, com diversidade de fauna, flora e solo, visto que as onças são consideradas espécies ‘guarda-chuvas’. Caso elas deixem de existir na Caatinga ou em qualquer outro lugar, pode ter certeza que a qualidade do ambiente foi afetada.
O Programa Amigos da Onça realiza monitoramento com câmeras trap e rádio-colares para compreender quais são os locais mais importantes de conservação das duas espécies, sendo locais que apresentam refúgios, água e fontes de alimentos disponíveis. Além disso, trabalha concomitantemente com as comunidades locais, que convivem diretamente com as onças, por meio de palestras, conversas e cursos de capacitação. Sem a integração da parte ecológica com a dimensão humana, não é possível fazer conservação, e, consequentemente, reduzir a taxa de caça e fragmentação do habitat dessas duas espécies símbolos da nossa biodiversidade.”
Instalação de uma armadilha fotográfica na região de Sento Sé, Bahia, para registrar a ocorrência das onças, em 2022. Imagem: Anderson Souza/Acervo PAO
Da criação do Programa até os dias atuais, as redes sociais cresceram e tornaram-se cada vez mais instantâneas, inclusive as formas de comunicação e maneiras de transmitir informações ao público. Dessa forma, comparado ao período que você entrou no PAO até hoje, o que você considera benéfico e o que sente que precisa melhorar na comunicação científica com o público? Quais públicos o Programa alcançou por meio das redes sociais que, sem elas, você acha que seria mais dificultoso alcançar?
Sylvia Hiromi, coordenadora de comunicação: “Desde que ingressei no Programa, notei um aumento significativo no número de pessoas interessadas em conhecer tanto o Programa quanto às atividades relacionadas à Caatinga e às onças da região. Uma das vantagens do mundo digital é o alcance das informações, que podem ser disseminadas por diversas regiões do Brasil e do mundo, permitindo que a informação científica chegue a um público muito maior e mais diversificado, incluindo pessoas que antes não tinham acesso fácil a esse tipo de conteúdo. No entanto, uma das dificuldades desse meio, que o PAO se propõe a combater, é a verificação da veracidade das informações. A rapidez na disseminação de informações pode levar à propagação de dados incorretos ou não verificados, como as fake news. É crucial que a informação científica seja rigorosamente checada antes de ser compartilhada. Ao longo dos últimos anos, nosso público tem sido majoritariamente composto por estudantes ou interessados na conservação da biodiversidade da Caatinga e nas lutas sociais do povo nordestino. No entanto, o PAO ainda tem como meta alcançar mais a população local da região de atuação, aproximando ainda mais a verdadeira luta nordestina.”
O impacto humano na natureza tem aumentado significativamente ao longo dos anos, principalmente na Caatinga, que tem cerca de 2% de unidades de proteção integral¹. Com isso, a responsabilidade de trabalhar em medidas de conservação da fauna e flora recaí sobre a futura geração. Com o trabalho desenvolvido no Programa até aqui, o que você julga essencial para atrair a nova geração para o trabalho ambiental – sejam as pessoas da área ou não?
Sarah Bessa, estudante de Ciências Biológicas e atual estagiária de comunicação: “As ações do programa voltadas à educação ambiental e divulgação científica são essenciais para a conscientização e sensibilização da nova geração. Por meio dessas atividades é possível transmitir conhecimentos científicos de forma compreensível e acessível, tanto para a comunidade acadêmica, quanto para pessoas leigas. Assim, acredito que a nova geração se sinta atraída pelo trabalho ambiental por meio do conhecimento, capaz de gerar um senso de pertencimento ao meio ambiente como um todo, despertar a curiosidade e a vontade de promover mudanças que contribuam para a conservação.”
Maria Eduarda Ferreira, estudante de Ciências Biológicas e atual estagiária do blog e site: “As redes sociais são as nossas principais ferramentas para alcançar o público jovem e disseminar as informações e ações do Programa. O site e o blog são meios de informação permanentes e que podem ser acessados a qualquer momento, então cativar o público que consome essas mesmas informações de maneira mais instântanea e rápida é essencial para os futuros passos na conservação da Caatinga, tarefa que eu vejo que está sendo cumprida com otimismo, tendo em vista que o Instagram hoje é a nossa rede social com maior alcance em todas as regiões do país.”
Manutenção dos currais anti-predação dos nossos criadores parceiros na comunidade de Lagoa do Mari, em novembro de 2023. Saiba mais sobre essa ação no nosso Instagram! Imagem: Acervo do PAO
O Programa Amigos da Onça agradece a à equipe de pesquisadoras, aos colaboradores de campo e aos estagiários que marcaram a nossa trajetória até aqui, além das parcerias findadas ao longo dos anos. O seu apoio e força foram – e são – essenciais para mantermos o nosso objetivo, a defesa da Caatinga, de pé. Para acompanhar de perto o trabalho do Programa, não esqueça de seguir as nossas redes sociais, onde mais interagimos e conhecemos o nosso público! Você pode participar da comemoração do nosso aniversário comparecendo ao nosso primeiro ciclo de palestras online voltadas à biodiversidade, a EcoJornada: Estratégias para Conservação, que está com inscrições abertas e acontecerá no dia 10 de agosto (para mais informações, acesse o link destacado).
REFERÊNCIAS
1. AMBIENTE, Ministério do Meio. Caatinga. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/biodiversidade-e-biomas/ecossistemas/biomas/caatinga. Acesso em: 30 jul. 2024.
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